Como se preparar agora para a retomada da economia
Por Carlos Correa & Guto Lopes |
Muito se discute sobre como a economia vai se recuperar. Se ela vai retomar as atividades em “L”, em “U” ou em “V” e evitando pensar no “W”. Uma discussão muito complexa e com perspectivas e expectativas que devem variar em cada país, e até mesmo dentro de um mesmo país. Como se preparar, então?
Entendemos que duas máximas serão confirmadas em qualquer cenário:
• A economia vai retomar. Prepare-se!
• Mas vai ser diferente e altamente impactada pelos novos hábitos. Se melhor ou pior, não se sabe. Mas será diferente!
Baseado nisso, sugerimos uma reflexão em 3 etapas:
1. Quais serão os novos hábitos?
Já se aceita que a economia irá reabrir ainda sem uma vacina. Com isso, hábitos e legislação de higiene serão mais rigorosos. Sairemos da crise com aversão a eventos de grande aglomeração? Reduziremos viagens? Compras de imóveis e automóveis irão cair? Com o uso do home-office, como ficará o uso de prédios e espaços comerciais por grandes empresas? E o modelo educacional? Será reavaliado? Haverá infraestrutura para isso?
Durante os períodos críticos da crise, caiu o uso do Instagram e cresceu o uso do Facebook em busca do contato, mesmo que virtual. O afastamento social mudou o comportamento das pessoas. Sairemos da crise com um balanço diferente entre vida privada e vida no trabalho.
2. Como esses novos hábitos irão impactar o seu modelo de negócio?
Aqui sugerimos que haja uma reflexão mais complexa. Avaliar que as viagens podem cair 20% nos próximos anos e readequar sua malha e estrutura de custos a isso, pode ser uma análise simplista do problema. Alguns exemplos mais complexos, podem ilustrar como esse exercício pode ser feito:
Na indústria de bebidas, uma análise superficial indicaria que o consumo diminuirá em restaurantes e bares, porém aumentará em casa e o volume será mantido. Uma análise simples como essa poderá impedir um estudo mais profundo de todas as cadeias e canais de distribuição. Nesse segmento, por exemplo, as margens são diferentes. Tipicamente, a indústria tem uma margem muito maior na venda para bares e restaurantes, enquanto o consumo em casa é controlado pelos grandes distribuidores que tem grande volume de compras e conseguem negociar com mais força, reduzindo muito a receita da indústria. Como sair dessa? É importante revisar a cadeia logística de entrega em bares, que é altamente complexa, e aumentar sua produtividade.
Por falar em grandes distribuidores, os grandes varejistas tinham duas formas de vender produtos: online e presencial. Os vendedores das lojas não vendiam online. Com a crise, os vendedores, em afastamento social, passaram a poder vender online, de casa. Possivelmente, no pós-crise, as duas formas de venda passarão a ser uma só, e os vendedores também poderão vender online, mesmo estando fisicamente na loja. A venda online de produtos de saúde e higiene (pastas de dente, absorventes) que por seu baixo valor unitário, quase não acontecia, já dobrou durante a crise. Como ficará depois da retomada? Para qual perfil de consumo as empresas devem se preparar?
Outro exemplo: os hospitais particulares terão um aumento de volume e de lucro, uma vez que o movimento nos hospitais aumentou muito, correto? Não! Análises do setor apontam que cirurgias simples e eletivas serão adiadas ou mesmo definitivamente canceladas. E as margens dessas instituições é muito mais alta nesse tipo de procedimento do que no atendimento ambulatorial/emergência. Logo, hospitais precisarão ser repensados e reestruturados para essa mudança de comportamento.
Já a indústria automobilística se prepara para um período de menor estoque, visando produzir quase que por encomenda. Como seu setor pode ser impactado com essa mudança?
3. O que acontece, historicamente, após grandes catástrofes e grandes epidemias?
Mesmo essa crise tendo alcançado proporções diferentes das anteriores, sugerimos também analisar um pouco a história e entender qual foi o comportamento passado. Euforia? Receio? Vale lembrar que o atentado de 11 de setembro de 2001 transformou a aviação com impactos no comportamento dos consumidores e em quase todos os demais segmentos econômicos. Nessa retomada do pós-crise, como governos e empresas reagirão com relação às questões ligadas à saúde dos profissionais?
Para os prestadores de serviço intensivos em mão de obra, quais serão as exigências dos contratantes com relação ao controle de saúde dos profissionais? Principalmente sobre aqueles dos chamados grupos de risco? Idosos e cardiopatas, por exemplo, serão passíveis de novas exigências? Como isso impactará seu negócio?
Entender o passado sempre ajuda a planejar o futuro, mas tenha em mente que: nunca tivemos tanta tecnologia disponível como hoje e essa será a primeira grande crise com o atual aparato tecnológico. E a chegada do 5G aumentará ainda mais as possibilidades da telemedicina e dos veículos conectados, entre outros.
Dados os exemplos, pense na sua empresa, na sua cadeia logística, nos seus clientes e nos seus fornecedores. Não basta só olhar para dentro da própria empresa e não é hora de largar funcionários e fornecedores à própria sorte, pensando apenas na sua retomada para depois voltar a procurá-los. É preciso responsabilidade ao longo de toda a cadeia. Enquanto isso, ainda durante a crise, é preciso providenciar treinamento para seus funcionários sobre as boas práticas mundiais de segurança e higiene para que a volta aconteça da forma menos traumática possível.
O empresário precisa estar pronto, independentemente de quando será o pós-crise, pois o quando não depende dele, nem das estatísticas e sim das reações dos sistemas de saúde ao ataque do vírus.
A concorrência acirrada deixou de lado a solidariedade, a interdependência e o alinhamento de condutas. Abordagens e soluções conjuntas e alinhadas podem se tornar um importante legado dessa crise.