É possível falar em transição energética sem falar em educação, treinamento e qualificação profissional??

Por Carlos Corrêa |


Em uma das páginas que anunciava a realização do Rio Innovation Week 2024, que aconteceu em agosto deste ano, o texto dizia que “estamos em um momento crucial para o futuro do planeta, onde a inovação e tecnologia são essenciais para a sustentabilidade”. Em setembro, o BNDES promove um seminário intitulado “Biofuels In the Context Of Bioeconomy”, que irá debater qual o papel dos biocombustíveis no futuro sustentável do planeta. Quase ao mesmo tempo, o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás, patrocina, na mesma cidade do Rio de Janeiro, o Congresso Rio Oil & Gas Energy que se diz “um dos maiores eventos de energia do mundo”. Isso apenas na cidade do Rio. Movimentos semelhantes se repete em São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Belém e tantas outras cidades importantes do país. Um campo amplo que trata de transição energética e sustentabilidade, olhando para o desenvolvimento industrial no Brasil e seu papel no futuro do país, e do planeta.

Inovação e sustentabilidade são palavras que estão em moda: correntes ligadas ao setor de óleo e gás, advogam que o gás natural é o combustível da transição energética no caminho da sustentabilidade; setores ligados à crescente bioeconomia, defendem que a transição para a sustentabilidade deve ocorrer com a diminuição de combustíveis fósseis e o crescimento do uso de biomassa na geração de energia; uma forte tendência na indústrias automobilísticas europeia e chinesa, por exemplo, indica que o futuro da matriz energética global está na inovação do setor de transporte, através da eletrificação; o aumento da velocidade das rede de transmissão de dados, aponta para a inovação no sistema de informação na direção da indústria 4.0, onde fábricas serão comandadas a distância e com o uso da inteligência artificial. Parece que temos um futuro próspero pela frente… será mesmo?

Não é difícil encontrar na mídia, diversos artigos e matérias falando que o Brasil vive um aparente paradoxo com muitos profissionais desempregados e indústrias precisando de profissionais sem conseguir encontrá-los. Parece existir uma enorme defasagem entre a formação e o treinamento que os profissionais recebem e a qualificação que a indústria precisa.

No final de 2023, a revista Isto É, publicou um artigo afirmando que até 2030 faltarão 85 milhões de profissionais no campo da engenharia ao redor do globo. Só no Brasil, segundo a matéria, de 2021 e 2025 mais de 53 mil profissionais irão se graduar anualmente em engenharia enquanto a demanda projetada aponta para uma necessidade anual de 800 mil. Um déficit enorme de profissionais de tecnologia no período de 4 anos. Em 2007, segundo dados da OCDE, o Brasil formava 1,95 engenheiros a cada 10.000 habitantes, enquanto países como Finlândia, China, Japão, Suécia graduava mais de 10 engenheiros(as) a cada 100.000 habitantes. Em uma lista de 35 países, o Brasil é o último, sendo que o penúltimo, a Turquia, formava 3,26 a cada 100.000. Quase 70% a mais que o Brasil. E lá para cá, segundo o MEC, houve queda no número de alunos matriculados em cursos de engenharia. Ou seja: pioramos!

E o problema não se restringe aos profissionais com formação universitária. O mesmo acontece com o nível técnico e com profissionais operacionais. Todo o desenvolvimento tecnológico que busca inovar no caminho da sustentabilidade cria a necessidade de novas capacitações que não são atendidas, e lacuna só tende a crescer. Mas isso não é de se admirar em um país que parece não gostar muito dos professores, a julgar pelos salários que recebem.

Todo o movimento feito no país na direção da inovação e da sustentabilidade, que deverão sustentar a já famosa transição energética, para ter sucesso, precisará ser acompanhado por um esforço gigantesco no caminho da formação educacional, técnica e profissional dos brasileiros. Tanto dos profissionais que já estão no mercado de trabalho, quanto daqueles que não conseguem sua vaga por falta de qualificação, além, claro, dos jovens, que logo, logo chegarão lá. É um esforço que deve partir tanto do setor público quanto do setor privado. E já estamos muito atrasados!!

Sem educação e formação profissional, não faz diferença se o caminho da transição energética passa pelo gás natural ou vai direto para a queima de biomassas; se o carro do futuro será elétrico ou não. Sem educação e formação profissional, nós vamos assistir, quem sabe de camarote, ao desfile da inovação e da sustentabilidade sendo conduzidas por empresas e países longe de nós, enquanto continuamos exportando commodities.

Antes da transição energética precisamos passar por uma transição de educação, formação e capacitação profisisonal para que possamos, no mínimo, acompanhar as mudanças tecnológicas que estão acontecendo no planeta. Mas se formos bons (e temos capacidade pra isso) nessa transição, quem sabe poderemos não apenas acompanhar, mas liderar a transição energética que o país e o planeta estão desenhando.

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